quinta-feira, 15 de abril de 2010

Estado, esporte e dinheiro

Artigo publicado no Correio Braziliense no último domingo.
POR RAQUEL TEIXEIRA*
http://blogdojuca.uol.com.br/


O esporte como indústria no Brasil esteve, por décadas, condenado a inexistir em virtude da desimportância dedicada pelo Estado ao setor. Essa realidade, que condenou o esporte brasileiro a mendigar, é, hoje, passado. O setor não está mais à míngua. Dispõe de fontes inúmeras de recursos, aptas a garantir o desenvolvimento da atividade.

Com a aprovação da Lei Piva, os Comitês Olímpico e Paraolímpico (COB e CPB) foram aquinhoados, entre 2001 e 2009, com mais de R$ 735 milhões. Recursos que se avolumaram com a criação da Bolsa Atleta, responsável, em 2008 e 2009, pelo repasse de R$ 55 milhões aos atletas por ela beneficiados. E considerados os repasses da Lei Piva nesse período, o esporte brasileiro dispôs, em dois anos, de R$ 304 milhões.

Há mais, entretanto. O orçamento do Ministério do Esporte, entre 2003 e 2008, destinou mais de R$ 6 bilhões ao Programa Esporte de Alto Rendimento, tendo sido pagos, desse total, mais de R$ 4 bilhões. Além disso, as estatais garantiram, em 2007, R$ 297 milhões ao vôlei, à vela, ao tênis, ao futsal, ao atletismo, à ginástica, à luta olímpica, ao surf, ao handebol, ao esporte motor, aos desportos aquáticos, ao judô e ao basquete.

Dinheiro para o esporte, portanto, é farto. E destrinchado o numerário referente a 2007, constata-se que a Lei Piva assegurou ao COB e ao CPB R$ 99,9 milhões. Sem falar no fato de que, então, as entidades esportivas captaram, valendo-se da Lei de Incentivos Fiscais, R$ 50, 9 milhões.

Às vésperas dos Jogos de 2008, consideradas a Lei Piva e a Lei de Incentivos, o esporte contabilizou, portanto, aportes no valor de R$ 150,9 milhões. Mas não foi tudo. Em 2007, os patrocínios das estatais destinaram a entidades dirigentes e modalidades esportivas R$ 297 milhões, elevando o apoio a patamar invejável: R$ 447,9 milhões.

A esse total há que se acrescentar o orçamento do Ministério do Esporte de 2007: R$ 1,78 bilhão, dos quais foram pagos R$ 1,35 bilhão. O que, considerados os demais desembolsos, redunda em R$ 1,798 bilhão. Em contrapartida a tal magnanimidade, não corresponderam, nos Jogos de 2008, as conquistas sonhadas pela sociedade brasileira, responsável direta, por intermédio do pagamento de impostos diretos e indiretos, pelos recursos que irrigaram os cofres das entidades de administração do esporte.

Com a obrigação contratada pelo Brasil de realizar os Jogos de 2016, sobreleva-se a tarefa de preparar as delegações olímpica e paraolímpica para, na maior competição esportiva do mundo, colher marcas expressivas. Se examinarmos, entretanto, os resultados da delegação brasileira nos recém-encerrados Jogos Sul-Americanos, disputados na Colômbia, o otimismo com a captação do direito de realizar as Olimpíadas arrefece.

Defrontaram-se na competição, na modalidade atletismo, atletas Sub-23. Os que representarão seus países nos Jogos do Rio. O Brasil, que era hegemônico, amargou o terceiro lugar. Enquanto a Colômbia conquistou oito ouros e a Venezuela quatro, a delegação brasileira trouxe, apenas, três ouros.

Números à parte, a verdade é que o Brasil defronta-se com um imenso desafio – o de transformar o esporte em matéria de interesse prioritário. Como fez, em 1990, o governo da Espanha, ao sancionar a Lei 10. A partir daquele momento, o esporte de alto nível tornou-se de interesse do Estado.

Enquanto a Espanha, há 20 anos, adotava uma decisão a favor do esporte, essa indústria, que gera benefícios sócioeconômicos diversos, não motivou, ainda, o interesse do governo brasileiro a formular uma política de Estado para o esporte. Iniciativa que, uma vez tomada, resultará em um diploma polar, que garantirá a implementação de um planejamento estratégico, capaz de democratizar a aplicação dos recursos existentes para o setor e ampliar, de fato, o acesso de todos os segmentos da população à iniciação esportiva.

A oportunidade da América do Sul sediar, pela primeira vez, os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos fundamenta, porém, a obrigação de o país dispor de um diploma para o esporte semelhante, em intenções, aos existentes para os setores de educação e de saúde. Lei dispondo que o esporte de alto nível é de interesse do Estado e definindo regras que assegurem às instâncias formadoras de atletas os recursos hoje à disposição da indústria do esporte. O que lhes possibilitará, afinal, investir na descoberta e no aprimoramento de talentos motores que farão do Brasil, no futuro, uma potência esportiva.

*A professora Raquel Teixeira é deputada federal (PSDB-GO) e presidente da Comissão de Turismo e Desporto da Câmara dos Deputados.

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